A psicanálise em face dos desafios do ciberespaço

Marcio Garrit

Doutorando em Psicologia Clínica, PUC-Rio. Mestre em Psicanálise, Saúde e Sociedade, UVA/RJ. Membro associado SPID, e-mail: marciogarrit@yahoo.com.br

Introdução

Desde 2020, o mundo vem atravessando inúmeras mudanças devido ao Covid-19. Antes da pandemia se tornar uma realidade, a evolução tecnológica já era um fator de grandes mudanças, e seu poder e relevância na coordenação dos nossos modos de vida só se tornaram mais evidentes com a pandemia. Como a cultura é algo extremamente importante para a psicanálise, não teria como ficar de fora de tais mudanças tão impactantes, obrigando os analistas à implantação de novas formas de atendimento e quiçá de alguns embasamentos teóricos. Sendo assim, o nosso objetivo com esta pesquisa é propor uma ampla reflexão sobre a necessidade de integração da prática analítica ao mundo digital, assim como apontar para o posicionamento ético/clínico que devemos adotar diante do sofrimento dos sujeitos versus mudanças culturais.

Conforme Simões (2009), vivemos em uma era virtual, que marca o estabelecimento das relações pela capacidade de processamento das informações e seus conhecimentos gerados. Relações essas que são mediadas pelas máquinas, instituindo uma exclusividade na forma de se relacionar e, obviamente, excluindo todos que não estiverem integrados a essa lógica digital, pois há uma inteligência coletiva, que, de acordo com Lévy (2011), é o espaço dentro da cibercultura que concentra todas as informações produzidas, sendo um veneno para quem não participa dela e um remédio para quem consegue controlar seus desejos dentro dela.

A partir desse cenário, já presentificado na nossa cultura, cabe aos psicanalistas encontrarem um meio de não só entender o papel da evolução tecnológica e as complicações do ciberespaço para o psiquismo dos sujeitos, como também conciliar a psicanálise e as demandas digitais, seja pela presentificação dos sofrimentos desses outros sujeitos fabricados por essas demandas, seja pela necessidade de reavaliar outros embasamentos teóricos que satisfaçam as necessidades da prática clínica digital e ciberespacial.

O virtual, a cibercultura e seus outros sujeitos

O século XX pode ser considerado, sem sombra de dúvidas, o século que marca o crescimento e desenvolvimento da tecnologia. Não é novidade, para nós, no século XXI, que esse desenvolvimento foi moldando paulatinamente a forma de nos relacionar e de ver o mundo a partir dos anos 2000. Desde então, percebemos a disseminação, em nível mundial, do virtual, a ponto de assinalarmos esse período como sendo o “boom da internet”. A partir disso, percebe-se um interesse muito grande pela aquisição de computadores e acesso ao ciberespaço. Acreditamos que, a partir daí, inicia-se algo que jamais terá volta: a cibercultura.

Sabe-se que não é todo movimento cultural que tem força global ou poder de modificar nossa forma de fazer laços e entender o mundo. O século XXI vem deixando claro que o desenvolvimento tecnológico aponta para a realização de coisas que até poucas décadas pareciam utopias. A inteligência artificial é um exemplo disso, pois se mostra como uma ferramenta tecnológica em complexa e rápida evolução, que fatalmente irá modificar consideravelmente nosso lugar no mundo. Pertencente ao que se convenciona chamar de revolução 5.0, o objetivo da I.A é coabitar as estruturas, até então, exclusivamente humanas. Pensadores como Yuval Harari e Jürgen Habermas vêm tratando o assunto de forma própria e muito relevante.

Freud, ao longo de trinta anos (1908-1938), escreveu de forma clara e direta sobre a importância da cultura na formação do sujeito. Em todos os seus textos, ele deixa evidente a marca que a cultura insere no indivíduo, causando traumas, repressões, descargas pulsionais diversas etc. Em Psicologia das massas e análise do eu (1921), o mestre de Viena deixa marcado no seu texto duas passagens que demonstram bem essa relação. Inicia seu texto afirmando que o individual e o social são uma coisa só, e que há uma alteração psíquica no sujeito atrelado a massas, qual seja o tamanho.

Mas temos o direito de levantar a objeção que nos parece difícil atribuir ao fator numérico uma importância tão grande […] os inícios de sua formação podem ser encontrados em um círculo mais estreito, como o da família (FREUD, 1921, p.138-139).

Com isso, não podemos ignorar esse outro sujeito pertencente às massas virtuais, integrado à cibercultura, que não cessa de se modificar a cada passo da evolução tecnológica. Não fazer um exercício de colocar as práticas analíticas no ciberespaço é não só ir contra tudo que Freud escreveu como também corroborar o fim da psicanálise. Dado tal cenário, vê-se a importância de tentar entender o que seria o virtual e o que dele se pospõe.

Para Lévy (2011), o virtual transmite muito mais que imagem, ele transmite uma quase presença. No mundo virtual, a distinção entre original e cópia não tem grandes importâncias, pois há uma mistura de noções de identidade e localização. Com isso, define-se a virtualização como um desprendimento do particular, do tempo e a efetuação e perpetuação do que acontece. As informações se tornam coletivas, sem um dono imediato. O conceito de distância se relativiza, as relações de mercado se tornam mais transparentes e há uma percepção relevante de um sentimento de desterritorialização de tudo. Este movimento proporciona o surgimento de novos espaços com outras formas de operação, provocando novas formas de se relacionar e de se comunicar. A linguagem se torna própria, o movimento de aprendizagem e pensamento se acelera e a evolução cultural vai moldando novas formas e estruturas. Com isso, a virtualização da vida se torna mais forte e com novos parâmetros linguísticos, imagéticos e institucionais. A qualidade dos afetos se modifica, pois o sujeito tem na virtualização um mundo incessante de ofertas estéticas e práticas, o sentimento de não limite se coloca, e com ele uma imensidão de emoções exacerbadas. Vê-se que o mundo virtual acaba por

criar um novo mundo, que de forma direta e indireta se entrelaça com o não virtual, pois não há a possibi lidade do cessamento do primeiro.

O ciberespaço tem como particularidade a expansão de si pelos próprios sujeitos do ciberespaço. Cada um é responsável direto pela constante modificação desse novo mundo, se tornando ao mesmo tempo produtor e explorador. Lévy (2011) deixa claro que desse movimento se constitui um novo sujeito e infelizmente ainda não entendido como um sujeito de fato e sim algo que altera o curso, ou passageiro. É essa forma de ver o sujeito ligado ao mundo virtual que cria um cenário imaginário de dois mundos diferentes, e isso não é considerado o melhor caminho, pois o virtual já deixou mais do que claro que é apenas uma extensão do mundo não virtual, uma continuidade, e não um universo paralelo. Importante entendermos que a virtualização da vida está acontecendo em uma velocidade tão grande que gera uma “expulsão” dos sujeitos de suas antigas identidades. Resistir a esse novo momento cultural só causaria o caos, pois tudo se estrutura a partir da relação virtual. O mais recomendado a fazer é dar sentido a esse novo mundo, a essa nova cultura, a essas novas formas de pensar e, consequentemente, a um novo, ou diferente, sujeito.

Para entendermos um pouco mais desse mundo virtual, faz-se necessário discorrer mais sobre o ciberespaço. Lévy (2010) atribui a seu crescimento o movimento internacional, desde os anos 1980, de jovens interessados em criar novas formas de se relacionar e viver, ter um mundo diferente das relações presenciais, pois estas não atendem mais aos anseios e desejos desses sujeitos. A cultura é algo cíclico e se mostra mutável de longa data, tal movimento não é algo extraordinário, mas, sim, uma consequência do movimento cultural.

O ciberespaço, onde se articula a cibercultura, é um termo cunhado, segundo Lévy (2010), por Wiliam Gibson, escritor de ficção científica, em seu romance chamado Neuromante. Lê-se, nesta obra, a existência de um universo de redes digitais em que batalhas mundiais se travam com grandes modificações na estrutura econômica e cultural. Assim, conceitua-se o ciberespaço como um espaço de comunicação aberta por conexões mundiais de computadores e suas memórias incalculáveis de informação registrada. Esse volume inimaginável de informação e de acesso amplo vem tornando viável, e a cada dia mais e mais rápido, o surgimento de novas formas éticas e estéticas do sujeito de estar no laço social. E essas novas formas têm como base principal as relações a distância. Não olhar para isso seria como excluir a percepção de existir desse novo sujeito e, por consequência, do mundo que o rodeia.

A relação de resistência de alguns analistas a respeito da amplitude e profundidade do conceito de ciberespaço, talvez se explique pelos desafios que a cibercultura traz. Esta se mostra sem diretrizes, caminhos fixos e regras. Têm-se apenas indeterminações constantes e uma intensa, incessante e complexa construção, que, porventura, por associação, pode levar aqueles ao encontro de sua própria castração, de seus limites e dificuldades para aceitar a posição de problematização constante da prática analítica e, por isso, a evita. Tal evitação só irá corroborar a estagnação do sujeito e uma possível patologização de suas crenças, pois o ciberespaço produz conectividade global, ou seja, uma reorganização cultural mundial. Não há como ignorar ou se isolar disso. Não há como evitar a internet, pois estamos falando de outro plano de existência, não de modismos, mas, sim, de algo que modifica os gostos, os corpos, o pensamento, a economia, o consumo, a ética e a moral, salva e tira vidas, institui e derruba governos e governantes. Estar participante do virtual, ou do mundo digital, entendendo seu lugar no ciberespaço é o mínimo necessário para situar o sujeito na cibercultura que já se instalou. O movimento óbvio seria iniciar adaptações pessoais e coletivas e não insistir em impossibilidades, inclusive psicanalíticas.

O novo pode ser ameaçador, desgovernante, porém, não deve ser ignorado, pois ele, via de regra, sempre traz outras formas de enxergar a realidade. Temos na internet algo além de um dispositivo relacional, algo que se parece cada vez mais como um “ser vivo”, onipotente e onipresente, ou até mesmo um tipo de exten são corpórea de seus usuários. Esse tipo de relação institui novas demandas e outros sujeitos. E é disso que nos disporemos a tratar a partir de agora.

Vê-se com Kallas (2016) que a internet traz a imprevisibilidade e o novo, protege os sujeitos digitais oferecendo “anonimato” ou favorece a percepção de ser anônimo ou qualquer outro ser. Isso proporciona a criação de novas fantasias, o que poderíamos chamar de fantasias on-line, ou seja, o sujeito executa no on-line o que no presencial não teria como, ou não conseguiria fazer. Todas essas fantasias on-line encontram aceitação no ciberespaço. Sempre há um lugar que acolhe o que se executa, por mais perversidade que a fantasia on-line apresente. Com isso, a relação ética do sujeito com seu ato virtual se ausenta, e ele se mune de um autopoder e acredita poder viver numa intensa regressão, em contato direto com seu Eu ideal.

Além dessa relação prejudicial, a internet relativiza a percepção de tempo e espaço, facilita os esquecimentos e altera o estado de consciência por possibilitar ao sujeito a “vivência” de uma outra persona. Um outro Eu se estabelece e uma nova relação se presentifica: faço e sou o que quero, não me exponho, não sou punido e não há ausências de gratificação. Percebe-se que o ciberespaço fomenta a criação de um espaço “entre”, um espaço intermediário, ou, se preferir, um espaço delirante.

Esse cenário virtual passa o sentimento de que os sujeitos não usam a internet, eles SÃO a internet. Esse movimento evidencia a sensação de onipotência e as leis do aparelho psíquico parecem não abarcar o funcionamento já estabelecido. Falamos de um sujeito pertencente a um cenário sem barreiras, sem diretrizes, “andando de mãos dadas” com um outro Eu que mais interessar. O ciberespaço proporciona onipotência com escravidão, por mais paradoxal que seja, e com isso, por um lado, faz emergir um sujeito permeado de uma sensação de completude por conseguir satisfazer suas fantasias on-line, e, por outro lado, faz se presentificar um sujeito a cada dia mais insatisfeito e angustiado pelo excesso de ofertas que a cibercultura produz. Tudo se torna fluido, descartável, intenso e patológico. As compulsões encontram seu mundo ideal a partir dessas produções.

Esse outro sujeito, que se faz o próximo e atual sujeito da cultura, vê, sente e se relaciona de uma “não maneira”, pois, ao se estabelecer uma nova forma de se relacionar, outra já se institui. Com isso, a clínica psicanalítica precisa dar sentido ao que acontece no contemporâneo para poder continuar tendo sentido aparecer como clínica na cultura. O enlaçamento da psicanálise com a cibercultura se faz necessário, e só ocorrerá se os psicanalistas pararem de insistir em praticar uma psicanálise analógica em um mundo digital.

Analista, analisando, uma nova clínica ou uma nova forma de psicanalisar

Não é de hoje que as transformações culturais vêm exigindo dos analistas e, consequentemente, da própria psicanálise novas formas de posicionamento e esclarecimento perante o novo. O atendimento virtual é um exemplo disso, pois mostra, de acordo com Garrit (2021), que a resistência de muitos analistas precarizou as pesquisas sobre a possibilidade de termos uma psicanálise conciliada com o ciberespaço. Além disso, inacreditavelmente, se torna antagônica aos próprios parâmetros teóricos da psicanálise, fato observado nos escritos de Freud e Lacan, por exemplo. Sabe-se da solicitação de Lacan para que atualizemos a psicanálise, colocando algo de si nela, e também da importância que Freud expõe sobre a psicanálise acompanhar a cul tura na qual está inserida. A pandemia evidencia uma ortodoxia que necessita ser repensada urgentemente, pois, como afirma Figueiredo (2007), não se pratica a psicanálise em um vazio cultural e histórico, a psicanálise não deve ser vista como uma seita conservadora e reformista. Ela deve se apoiar no cotidiano para que se mostre como uma proposta ética e analítica válida de minoração do sofrimento humano.

A proposta ética evidenciada aqui, acreditamos, deve se iniciar com a protagonização para os olhares analíticos as transformações e demandas dos sujeitos que se dirigem à clínica. De acordo com Green (2019), no seu livro de diálogos em parceria com Urribarri, o autor afirma que sua concepção de sujeito é algo em curso, não sendo possível ser fechado em razão da heterogeneidade de fatores que o compõe. Com isso, vê-se que o sujeito é uma construção constante que se estrutura de acordo com a cultura e o tempo a que pertence, evidenciando novas demandas e consequentes modos de sofrer e estar no laço social.

Sendo a psicanálise orientada relativamente por aquilo que é dito pelos analisandos no setting (GREEN, 1979), ela marca a estreita relação que tem com fatores muito exclusivos e subjetivos na sua elaboração prática e teórica. Não à toa, Green (2018) disse que a incerteza é um fator preponderante em psicanálise, em que o sujeito só pode ser visto de forma indireta, na relação entre inconscientes no setting, marcando o alto nível de complexidade para elaboração de uma teoria. Tal teoria que não cessa de mostrar sua impossibilidade de abarcar toda a clínica, deixando sempre um resto que demandará do analista seu entendimento. Dessa forma, entende-se que o avanço da psicanálise só se mostrará viável a partir de uma relação teórica pluralista, em um diálogo contínuo de propostas correspondentes e antagônicas entre si, em que o retorno a Freud não se mostra exclusivamente necessário, mas sim a insistente articulação do intrapsíquico com o intersubjetivo, tornando, assim, a psicanálise uma teoria constantemente construída a partir da experiência. Com isso, percebemos que a psicanálise se direciona insistentemente para o psicanalista, demandando uma eterna atualização em relação ao desenvolvimento de sua prática, colocando-o diante do chamado para se modernizar ou continuar com posições ortodoxas que poderão culminar em uma paralisia da própria psicanálise.

Esse contemporâneo, tão evidente na obra de Green, é aquilo que aponta para estruturas não neuróticas, e todo modus operandi que crie a necessidade de uma atualização para retirar a psicanálise dos impasses que se apresentarem a ela, pois Freud não respondeu tudo, e é herança dos psicanalistas darem continuidade nessas buscas. O conservadorismo na psicanálise deve ser repensado, principalmente quando as surpresas surgem na clínica. Essa necessidade de um olhar mais adequado às demandas do contemporâneo pede também uma constante visitação da teoria, para que ela continue no nível de outras áreas, por exemplo, as neurociências e as demandas contemporâneas das ciências sociais, possibilitando a participação e ofertando condições de estar no debate consistentemente, já que seus propósitos clínicos exigem isso.

Diante desses desafios, Green defende o pensamento clínico como uma demonstração ética do analista em acompanhar as sutilezas de cada caso em relação a sua operação transferencial e contratransferencial, pois a clínica atual tem como fundamento a transformação constante. Como já dito, o sujeito inserido na cibercultura é impulsionado a transformações constantes. E é justamente o insistente retorno aos problemas clínicos que marcará a prática analítica como uma prática contemporânea.

Partindo de tal posicionamento, nos dirigimos a uma parte dos diálogos, em que, indagado por Urribarri se o tratamento analítico direcionado a Marilyn Monroe seria correto ou não, Green responde evidenciando condutas que levam a erros que merecem toda nossa atenção, além de propor um manuseio clínico mais condizente com uma forma de pensar essa prática contemporânea. O psicanalista francês alerta para o perigo de atitudes fatalmente comuns na clínica, sendo elas: a onipotência do analista diante da crença fixa no seu método e a incapacidade de perceber que há momentos que a única saída seria a “invenção de uma técnica” para dar conta daquilo que a teoria até então estabelecida não responde. Uma posição conservadora e de fidedignidade excessiva a uma psicanálise já escrita e dita como definitiva, assim como foi iatrogênico para Marilyn Monroe, pode ser também para outros analisandos.

Saber dos efeitos da fala do analisando no analista e conhecer os limites que o analista pode sustentar a partir dessa fala, é essencial para um bom caminho em análise. Essa postura de evidenciar limites e obstáculos é crucial para incitar o progresso da psicanálise, pois o mais importante é manter o objetivo da psicanálise como pensamento clínico, avançando e progredindo, tentando cumprir com as exigências que a cultura impõe a cada fase. Sendo assim, pensar o futuro da psicanálise é repensar os dogmas que ela apresenta em todas as suas demonstrações teóricas constantemente. De acordo com Tanis (2014), na sua leitura de Green, nisso deve constar, desde a necessidade do divã à dinâmica da castração. Não podemos esquecer que o mal-estar na cultura é inerente e doloroso e que tal mal-estar exige da psicanálise constantes respostas para amenizar os perigos e infortúnios que é estar no laço social. Isso exige do analista o pensamento clínico, ou seja, a busca da melhor forma de pensar a psicanálise com e na clínica, sempre integrando e não distinguindo.

Percebemos que a resistência do analista, apontada anteriormente, a respeito dos estudos da prática clínica on-line, da flexibilização em relação a técnicas de atendimento e teorias sobre o Eu, acabaram por estagnar a psicanálise perante algumas demandas do contemporâneo. O analista que insiste em se colocar de forma analógica em um mundo que, aos poucos, vai deixando de ser analógico perde a oportunidade de entender outras dinâmicas, possivelmente, por sua necessidade de negar que a própria prática analítica não se sustenta em suas próprias convicções e, também, talvez, pela dificuldade extrema de enlutar aquilo que aprendeu. Tais analistas não percebem que, ao insistirem conservadorismos, ortodoxias, fantasias de rigor científico em psicanálise e crenças em teorias definitivas sobre o sujeito, ajudarão a posicionar a psicanálise em vitrines metafísicas e mundos paralelos. É necessário saber quando mudar e ter a humildade de largar ou diversificar aquilo que foi instituído ou aprendido. Afinal, psicanálise não é química, em que a água será sempre H2O.

Conclusão

Para concluir, e sem a menor intenção de esgotar o assunto, nosso objetivo foi incitar os psicanalistas a não retroceder ante os desafios que o ciberespaço oferece desde o início do século XXI, com um vasto campo a ser descoberto e adaptado perante as práticas psicanalíticas. Torcemos para que nasça o interesse de uma grande produção teórica que objetive fortalecer a psicanálise em face das mudanças e não a inviabilize por motivos políticos ou sintomáticos.

Referências

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