PSICANÁLISE EM TEMPOS DE PANDEMIA
EDITORIAL
Ficamos trancados em casa. Ou entre paredes isoladas do contato físico, do olho no olho, dos abraços e dos apertos de mão. Lá fora, ora medo, ora negação. Uma pandemia mundial nos faz reinventar encontros em que o contato virtual possibilite estudos, atendimentos e trocas.
Desde a primeira semana de agosto, o Brasil registra a marca de mais de 100 mil mortos pelo COVID 19. O vírus tem sido cruel no mundo todo, mas aqui o luto coletivo é assombroso.
Vivemos um desgoverno em diferentes âmbitos da nossa vida, com o negacionismo da ciência e a irresponsabilidade política quanto à segurança da população. As pessoas e as instituições ficam à deriva. Floresce uma responsabilidade das associações e das sociedades de profissionais que podem ser referências reparadoras. Os grupos de amigos ganham força.
O país está cindido: um lado nega o risco do COVID-19 e não sente o peso de cada número de infectados que cresce; outro lado, tenta, por meio da arte, da ciência, da cultura e da educação sublimar a dor. A solidariedade brota nas casas, nos gestos e na reinvenção de modos de subjetivação. Usamos máscaras para nos proteger dos
outros. E de um inimigo comum – um invisível vírus. O contato corpo a corpo é evitado. É hora de reinventar a psicanálise!
A SPID – Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle, solidária com os riscos da pandemia mundial, está em funcionamento virtual desde março de 2020. Os seminários, as aulas, as palestras e as reuniões clínicas acontecem por meio de ferramentas virtuais.
A rotina dos analistas e dos analisantes mudou. E o nosso olhar, mais do que nunca, se volta para as práticas que valorizam os cuidados de si e dos outros. Práticas que resgatam elementos brincantes, os afetos, a linguagem sensorial, o infantil de Freud. É o momento de estar perto do outro, mesmo distante. Deixar a criança de cada um imaginar e criar modos possíveis para as relações em rede.
A nossa revista Ensaios lança um número especial, de forma virtual, coerente com o quadro social ao redor. Temos aqui uma dúzia de artigos que falam do contexto pandêmico, do isolamento social e do impacto desse caos na prática clínica.
Dois textos partem de teorias da filosofia e da psicanálise, como “O Atravessamento pela Palavra”, de Victor Di Francia Alves de Melo e “Imunidades Reais e Simbólicas: Ensaio sobre Desconstrução e Alteridade”, de Victor Maia.
Há dois artigos que nasceram no calor da realização de seminários ministrados pela internet: “Crise Social e Cuidado de Si em Tempos de Pandemia – Foucault e a Psicanálise”, de Auterives Maciel Júnior e “O Trauma como um Acordar para uma Responsabilidade Alteritária”, de Edelyn Schweidson.
Três reflexões sobre o aqui e o agora chegam para pensar a quarentena, que já é uma infinidade de dias e de meses: “Dar Voz ao Espanto”, de Cynthia Azevedo; “Pandemia, Trauma e Transformações”, de Janaina Pires Garcia; e “AC/DC (Antes e Depois do Coronavírus)”, de Nadia Couri.
Alguns artigos ressignificam a prática psicanalítica, alternam a teoria e algumas impressões sobre a soberania da clínica: “Pandemia e Prática Psicanalítica”, de André Avelar; “Psicanálise em Tempos de Pandemia”, de Angela Coutinho; “Algumas Reflexões sobre a Clínica em Tempos de Pandemia”, de Leandro Santos; “Considerações sobre a Clínica do Isolaumento: Aquilo que se Perde e Aquilo que se Ganha”, de Luiza Cardozo; e “O Mal-estar do Divã ou o Divã do Mal-estar?”, de Ninfa Parreiras.
A revista Ensaios pretende ser um canal aberto de diálogos dos membros da SPID, com o olhar para as teorias e as práticas plurais; para as relações horizontais, sem uma hierarquia de comandos entre os integrantes da Sociedade; e para a manutenção de uma troca recíproca entre os pares. Agora, ela está no ar, à disposição dos leitores!
Os textos aqui publicados refletem a opinião dos respectivos autores e são da responsabilidade de cada um.
Venha participar deste movimento possível, na virtualidade, com a leitura desta revista organizada pela SPID e a contribuição dos 12 autores. Assim, podemos pensar o impacto que temos vivido com essa nuvem de pandemia, isolamento e afastamento social. E para a busca de novos rumos para a psicanálise.
Ninfa Parreiras
Psicanalista, membro titular SPID, professora de Literatura, escritora e produtora cultural. Mestre em Literatura Comparada (USP).
SUMÁRIO
I. ENCONTROS
Crise social e cuidado de si em tempos de pandemia – Foucault e a psicanálise (Auterives Maciel Júnior)
O trauma como um acordar para uma responsabilidade alteritária (Edelyn Schweidson)
II. PESQUISAS
O atravessamento pela palavra (Victor Di Francia Alves de Melo)
Imunidades reais e simbólicas: ensaio sobre desconstrução e alteridade (Victor Maia)
III. ANTENA
Dar voz ao espanto (Cynthia Azevedo)
Pandemia, trauma e transformações (Janaina Pires Garcia)
AC/DC (Antes e depois do coronavírus) (Nadia Couri)
IV. A CLÍNICA RESSIGNIFICADA
Pandemia e prática psicanalítica (André Avelar)
Psicanálise em tempos de pandemia (Angela Coutinho)
Algumas reflexões sobre a clínica em tempos de pandemia (Leandro Santos)
Considerações sobre a clínica do isolaumento: aquilo que se perde e aquilo que se ganha (Luiza Cardoso)
O mal-estar do divã ou o divã do mal-estar? (Ninfa Parreiras)
COMISSÃO EDITORIAL
Angela Coutinho
Carolina Vidal
Cynthia Azevedo
Janaina Pires Garcia
Leandro Rafael Ferreira dos Santos
Nadia Couri
Ninfa Parreiras
Patricia Guimarães
APOIO SECRETARIA SPID
Adriana Mendes
Heloisa Vogel